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A puberdade - Pipocas que não controlo?

A puberdade, que faz parte da adolescência, é marcada pela activação do chamado eixo hipotálamo-pituitária-gonadal que culmina na maturação gonadal.

Mas o significa isso? De uma maneira muito simples, no período peripubertário, o qual acontece imediatamente antes do aparecimento das primeiras mudanças físicas, depois de uma pausa durante a infância, a chamada “pausa juvenil”, o hipotálamo aumenta a sua actividade pulsátil. Este aumento leva por sua vez a um aumento da secreção das gonodotrofinas pituitárias e, consequentemente das hormonas sexuais produzidas nas gónadas, as quais são responsáveis pelo aparecimento dos caracteres secundários, pelo crescimento acentuado e início da puberdade (Gardner e Shoback, citados por Ferraz, 2014)1. No fundo e em síntese, é o processo cerebral e hormonal que desencadeia o início da puberdade.

As principais hormonas sexuais: testosterona, estrogénio e progesterona, de formas diferentes em cada um dos sexos, são responsáveis na adolescência por alterações físicas, específicas em cada sexo: nos rapazes, engrossar de voz, aparecimento de pêlos na cara, peito, axilas e zona púbica, aumento da musculatura e alargamento dos ombros, crescimento do pénis e testículos, crescimento lento e prolongado; nas raparigas, pronunciamento das ancas, aparecimento de pêlos na zona púbica e nas axilas, crescimento das glândulas mamárias e crescimento rápido e curto. Ainda com o início da puberdade, as raparigas iniciam o seu ciclo menstrual, com a sua primeira menstruação, chamada menarca e os rapazes têm a sua primeira ejaculação. Nesta fase, assiste-se também ao aparecimento da acne.

As hormonas sexuais estão presentes desde o nascimento, mas hibernam durante mais de uma década, e o seu “regresso” depois da hibernação, marca a chegada da puberdade. Embora o início do período pubertário varie de acordo com influências ambientais, contextuais, familiares e entre sexos, é importante salientar que há puberdade precoce e puberdade atrasada e é importante enquanto pai/mãe estar atento a esses casos, devendo procurar ajuda especializada se suspeitar de atraso ou precocidade. Nas raparigas os primeiros sinais de puberdade podem ocorrer a partir dos 9 anos e nos rapazes a partir dos 10 anos, no entanto, tal não significa que todos entrem na puberdade a partir destas idades.

Sabe-se que na puberdade, as concentrações de cada uma destas hormonas alteram-se profundamente:

  • nas raparigas, o estrogénio e a progesterona irão flutuar com o ciclo menstrual, e estas estão ligadas a substâncias no cérebro que controlam o humor, daí poder haver flutuações mais drásticas do mesmo;

  • nos rapazes, a testosterona liga-se com muito facilidade aos receptores na amígdala (a estrutura que controla a resposta ao medo de fuga ou luta), daí que possa aumentar a agressividade ou o medo, contando com a imaturidade da amígdala nesta fase (Jensen e Nutt, 2015)2.

Como tal, podemos e devemos lembrar-nos que as hormonas sexuais não têm mesmo culpa de tudo aquilo que se vê no adolescente. As alterações profundas nas suas concentrações na puberdade juntamente com a interacção das mesmas com algumas estruturas cerebrais adolescentes leva a que o seu filho possa parecer uma máquina de pipocas que ele próprio tem dificuldade em controlar.

Apesar destas conjugações neurofisiológicas por si só capazes de desequilibrar e “abanar” até um adulto, como será de um momento para o outro o corpo mudar sem aviso, estar diferente, muitas vezes ainda por cima não se desenvolvendo todo por igual, simétrico. Agradável, não? E juntando-se a isto a cara cheia de borbulhas, ter de lidar com as primeiras menstruações ou o embaraço de erecções que aparecem sem avisar ou uma ejaculação que molha os lençóis sem nosso controlo? É difícil ficar tranquilo e aceitar de forma satisfeita, calma e ter a capacidade de acreditar que no final tudo ficará bem. Certo? Esse é também um enorme desafio do seu filho adolescente: a sua entrada na puberdade e a necessidade de se ajustar e viver dentro de um corpo cheio de mudanças estranhas, na maior parte das vezes nem sequer agradáveis, há que admitir.

A par disso, o surgimento de novas necessidades, vontades e curiosidades. Falo do despertar para a sexualidade que pode não ser acompanhado por uma parte psicológica igualmente maturada relativamente à vivência da mesma, expressando-se em termos de impulsos por parte do adolescente, difíceis de compreender mas bastante sentidos. A necessidade de os satisfazer, começar a conhecer-se sexualmente, a perceber melhor o que é para ele atrativo do ponto de vista sexual e tudo o que isso traz, assume nesta fase um enorme protagonismo, difícil de esconder ou ignorar pelo adolescente.

É tempo enquanto pai de estar novamente atento ao que está a mudar fisicamente, o que causa incómodo, o que é difícil de aceitar ou não está a ser aceite, que tipo de recursos o adolescente precisa, desde consultas médicas, a espaço para a sua intimidade, passando por escolha de novas roupas, soutiens, cuecas, até à necessidade de depilação e de ajuda com o tratamento da acne. Nos adolescentes, rapazes ou raparigas, com as mudanças físicas provocadas pelas hormonas sexuais na puberdade, o possível aumento de peso, aumento de curvas nas raparigas, percepção do adolescente de corpo diferente é fundamental que esteja atento e monitorize discretamente para perceber se ele está bem no seu corpo, se há sinais de alerta relativamente à autoimagem, ajudando-o a sentir-se bem também intelectualmente e emocionalmente, para maior resiliência com um novo corpo, que está em mudança também.

A culpa não é de todo só das hormonas, mas é preciso lidar com o que, de novo, elas contam no corpo e cérebro do adolescente. Não as culpe, mas não as desvalorize. Mudar(mos) não é fácil, especialmente sem aviso e sem controlo.

*Texto tirado do capítulo 3. Hormonas para que vos quero – “pipocas que não controlo” do livro “Adolescência, os anos da mudança” de Rita Castanheira Alves

1 Ferraz, Inês (2014) Sindrome de Kallmann: Artigo de Revisão. Trabalho Final do 6º ano medico com vista a atribuição do grau de mestre no âmbito do ciclo de estudos do mestrado integrado em medicina.

2 Jensen, F. E. & Nutt, A. E. The Teenage Brain: a neuroscientist´s survival guide to raising adolescents and Young adults. Harper Collins: New York. 2015.

Fonte imagem: http://moviiit.blogspot.pt

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